sexta-feira, 24 de setembro de 2010
terça-feira, 21 de setembro de 2010
José de Santa Rita Durão (Caramuru)

Caramuru - Poema Épico do Descobrimento da Bahia é composto de dez cantos e, de acordo com o gênero, divide-se em cinco partes: proposição, invocação, dedicação, narração e epílogo.
Canto I
Na primeira estrofe, o poeta introduz a terra a ser cantada e o herói - Filho do Trovão -, propondo narrar seus feitos (proposição). Na estrofe seguinte, pede a Deus que o auxilie na realização do intento (invocação), e da terceira à oitava estrofes, dedica o poema a D. José I, pedindo atenção para o Brasil, principalmente a seus habitantes primitivos, dignos e capazes de serem integrados à civilização cristã. Se isso for feito, prevê Portugal renascendo no Brasil.
Da nona estrofe em diante, tem-se a narração. A caminho do Brasil, o navio de Diogo Álvares Correia naufraga. Ele e mais sete companheiros conseguem se salvar. Na praia, são acolhidos pelos nativos que ficam temerosos e desconfiados. Os náufragos, por sua vez, também temem aquelas criaturas antropófagas, vermelhas que, sem pudor, andam nuas. Assim que um dos marinheiros morre, retalham-no e comem-lhe, cruas mesmo, todas as partes.
Sem saber o futuro, os sete são presos em uma gruta, perto do mar, e, para que engordem, são bem alimentados. Notando que os índios nada sabem de armas, Diogo, durante os passeios na praia, retira, do barco destroçado, toda pólvora e munições, guardando-as na gruta. Desde então, como vagaroso enfermo, passa a se utilizar de uma espingarda como cajado.
Para entreter os amigos, Fernando, um dos náufragos, ao som da cítara, canta a lenda de uma estátua profética que, no ponto mais alto da ilha açoriana, aponta para o Brasil, indicando a futuros missionários o caminho a seguir. Um dia, excetuando-se Diogo, que ainda estava enfermo e fraco, os outros seis são encaminhados para os fossos em brasa. Todavia, quando iam matar os náufragos, a tribo do Tupinambá Gupeva é ferozmente atacada por Sergipe. Após sangrenta luta, muitos morrem ou fogem; outros se rendem ao vencedor que liberta os pobres homens que desaparecem, no meio da mata, sem deixar rastro.
Canto II
Enquanto a luta se desenvolve, Diogo, magro e enfermo para a gula dos canibais, veste a armadura e, munido de fuzil e pólvora, sai para ajudar os seis companheiros que serão comidos. Na fuga, muitos índios buscam esconderijo na gruta, inclusive Gupeva que, ao se deparar com o lusitano, saindo daquele jeito, cai prostrado, tremendo; os que o seguiam fazem o mesmo; todos acham que o demônio habita o fantasma-armadura.
Álvares Correia, que já conhecia um pouco a língua dos índios, espera amansá-los com horror e arte. Levantando a viseira, convida Gupeva a tocar a armadura e o capacete. Observa, amigavelmente, que tudo aquilo o protege, afastando o inimigo, desde que não se coma carne humana. Ainda aterrorizado, o chefe indígena segue-o para dentro da gruta, onde Diogo acende a candeia, levando-o a crer que o náufrago tem poder nas mãos.
Sob a luz, vê, sem interesse, tudo que o branco retirara da nau. Aqui, o poeta, louva a ausência de cobiça dessa gente. Entre os objetos guardados pelos náufragos, Gupeva encanta-se com a beleza da virgem em uma gravura.Tão bela assim não seria a esposa de Tupã? Ou a mãe de Tupã? Nesse momento, encantado pela intuição do bárbaro, Diogo o catequiza, ganhando-lhe, assim a dedicação.
Saindo da gruta, o índio, agora manso e diferente, fala a seu povo Tupinambá, ao redor da gruta. Conta-lhes sobre o feito do emboaba, Diogo, e que Tupã o mandara para protegê-los. Para banquetear o amigo, saem para caçar. Durante o trajeto, Álvares Correia usa a espingarda, aterrorizando a todos que exclamam e gritam: Tupã Caramuru! Desde esse dia, o herói passa a ser o respeitado Caramuru - Filho do Trovão. Querendo terror e não culto, Diogo afirma-lhes que, como eles, é filho de Tupã e a este, também, se humilha. Mas que como filho do trovão, (dispara outro tiro) queimará aquele que negar obediência ao grande Gupeva.
Nas estrofes seguintes, o poeta descreve os costumes da selva. Caramuru instala-se na aldeia, onde imensas cabanas abrigam muitas famílias, que vivem em harmonia. Muitos índios querem vê-lo, tocá-lo. Outros, em sinal de hospitalidade, despem-no e colocam-no sobre a rede, deixando-o tranqüilo. Paraguaçu é uma índia, de pele branca e traços finos e suaves. Apesar de não amar Gupeva, está na tribo por ter-lhe sido prometida. Como sabe a língua portuguesa, Diogo quer vê-la. Após o encontro os dois estão apaixonados.
Canto III
À noite, Gupeva e Diogo conversam sob a tradução feita por Paraguaçu. O lusitano fica pasmo ao saber que, para o chefe da tribo, existe um princípio eterno; há alguém, Tupã, ser possante que rege o mundo; aquele que vence o nada, criando o universo. O espírito de Deus, de alguma maneira, comunica-se com essa gente. Gupeva eloqüente fala acerca da concepção dos selvagens sobre o tempo, o Céu, o Inferno. Abordam a lenda da pregação de S. Tomé em terras americanas. Concluindo a conversa, o cacique diz que estão para ser atacados pelos inimigos; Caramuru aconselha-o a ter calma. De repente, chegam os ferozes índios Caetés que, ao primeiro estrondo do mosquete, batem em retirada, correndo, caindo; achando, enfim, que o céu todo lhes cai em cima.
Canto IV
O temido invasor noturno é o Caeté, Jararaca, que ama Paraguaçu perdidamente. Ao saber que ela esta destinada a Gupeva, declara guerra. Após o ataque estrondoso do Filho do Trovão, Jararaca convoca outras nações indígenas com as quais tinha aliança: Ovecates, Petiguares, Carijós, Agirapirangas, Itatis. Conta-lhes que Gupeva prostrou-se aos pés de um emboaba pelo pouco fogo que acendera, oferecendo-lhe até a própria noiva. O cacique alerta-os que se todos agirem assim, correm o risco de serem desterrados e escravizados em sua própria terra, enchendo de emboabas a Bahia. Apela para a coragem dos nativos, dizendo que apesar do raio do Caramuru ser verdadeiro, ele nada teme, porque não vem de Deus. Não há forças fabricadas que a eles destruam. A guerra tem início e Paraguaçu também luta heroicamente e, num momento de perigo, é salva pelo amado lusitano.
Canto V
Depois da batalha, os amantes discorrem sobre o mal que habita o ser humano e qual a razão de Deus para permiti-lo. Em seguida, em Itaparica, o herói faz com que todos os índios se submetam a ele, destruindo as canoas com as quais Jararaca pretendia liquidá-lo.
Canto VI
As filhas dos chefes indígenas são oferecidas ao destemido Diogo, para que este os honre com o seu parentesco. Como ama Paraguaçu, aceita o parentesco, mas declina as filhas. Na mata, o herói encontra uma gruta com tamanho e forma de igreja e percebe ali a possibilidade dos nativos aceitarem a Fé Cristã, e se dispõe a doutriná-los. Mais tarde, salva a tripulação de um navio espanhol naufragado e, saudoso da Europa, parte com Paraguaçu em um barco francês.
Quando a nau ganha o mar, várias índias, interessadas em Álvares Correia, lançam-se nas águas para acompanhá-lo. Moema, a mais bela de todas, consegue chegar perto do navio Agarrada ao leme, brada todo seu amor não correspondido ao esquivo e cruel Caramuru. Implora para que ele dispare sobre ela seu raio. Ao dizer isso, desmaia e é sorvida pela água. As outras, que a acompanhavam, retornam tristes à praia. Nas demais estrofes do canto, a história do descobrimento do Brasil é contada ao comandante do barco francês.
Canto VII
Na França, o casal é recebido na corte e Paraguaçu é batizada com o nome da rainha Catarina de Médicis, mulher de Henrique II, que lhe serve de madrinha. Diogo lhes descreve tudo o que sabe a respeito da flora e fauna brasileira.
Canto VIII
Henrique II se predispõe a ajudar Diogo Álvares na tarefa de doutrinamento e assimilação dos índios, oferecendo-lhe tropa e recompensa. Fiel à monarquia portuguesa, o valente lusitano recusa tal proposta. Na viagem de volta ao Brasil, Catarina-Paraguaçu profetiza, prospectivamente, o futuro da nação. Descreve as terras da Bahia, suas povoações, igrejas, engenhos, fortalezas. Fala sobre seus governadores, a luta contra os franceses de Villegaignon, aliados aos Tamoios. Discorre sobre o ataque de Mem de Sá aos franceses no forte da enseada de Niterói e sobre a vitória de Estácio de Sá contra as mesmas forças.
Canto XIX
Prosseguindo em seu vaticínio, Catarina-Paraguaçu descreve a luta contra os holandeses que termina com a restauração de Pernambuco.
Canto X
A visão profética de Catarina-Paraguaçu acaba se transformando na da Virgem sobre a criação do universo. Ao chegar, o casal é recebido pela caravela de Carlos V que agradece a Diogo o socorro aos náufragos espanhóis. A história de Pereira Coutinho é narrada, enfatizando-se o apoio dos Tupinambás na dominação dos campos da Bahia e no povoamento do Recôncavo baiano.
Na cerimônia realizada na Casa da Torre, o casal revestido na realeza da nação espanhola, transfere-a para D. João III, representado na pessoa do primeiro Governador Geral, Tomé de Souza. A penúltima estrofe canta a preservação da liberdade do índio e a responsabilidade do reino para com a divulgação da religião cristã entre eles. Na última (epílogo), Diogo e Catarina, por decreto real, recebem as honras da colônia lusitana.

Caramuru - Poema Épico do Descobrimento da Bahia é composto de dez cantos e, de acordo com o gênero, divide-se em cinco partes: proposição, invocação, dedicação, narração e epílogo.
Canto I
Na primeira estrofe, o poeta introduz a terra a ser cantada e o herói - Filho do Trovão -, propondo narrar seus feitos (proposição). Na estrofe seguinte, pede a Deus que o auxilie na realização do intento (invocação), e da terceira à oitava estrofes, dedica o poema a D. José I, pedindo atenção para o Brasil, principalmente a seus habitantes primitivos, dignos e capazes de serem integrados à civilização cristã. Se isso for feito, prevê Portugal renascendo no Brasil.
Da nona estrofe em diante, tem-se a narração. A caminho do Brasil, o navio de Diogo Álvares Correia naufraga. Ele e mais sete companheiros conseguem se salvar. Na praia, são acolhidos pelos nativos que ficam temerosos e desconfiados. Os náufragos, por sua vez, também temem aquelas criaturas antropófagas, vermelhas que, sem pudor, andam nuas. Assim que um dos marinheiros morre, retalham-no e comem-lhe, cruas mesmo, todas as partes.
Sem saber o futuro, os sete são presos em uma gruta, perto do mar, e, para que engordem, são bem alimentados. Notando que os índios nada sabem de armas, Diogo, durante os passeios na praia, retira, do barco destroçado, toda pólvora e munições, guardando-as na gruta. Desde então, como vagaroso enfermo, passa a se utilizar de uma espingarda como cajado.
Para entreter os amigos, Fernando, um dos náufragos, ao som da cítara, canta a lenda de uma estátua profética que, no ponto mais alto da ilha açoriana, aponta para o Brasil, indicando a futuros missionários o caminho a seguir. Um dia, excetuando-se Diogo, que ainda estava enfermo e fraco, os outros seis são encaminhados para os fossos em brasa. Todavia, quando iam matar os náufragos, a tribo do Tupinambá Gupeva é ferozmente atacada por Sergipe. Após sangrenta luta, muitos morrem ou fogem; outros se rendem ao vencedor que liberta os pobres homens que desaparecem, no meio da mata, sem deixar rastro.
Canto II
Enquanto a luta se desenvolve, Diogo, magro e enfermo para a gula dos canibais, veste a armadura e, munido de fuzil e pólvora, sai para ajudar os seis companheiros que serão comidos. Na fuga, muitos índios buscam esconderijo na gruta, inclusive Gupeva que, ao se deparar com o lusitano, saindo daquele jeito, cai prostrado, tremendo; os que o seguiam fazem o mesmo; todos acham que o demônio habita o fantasma-armadura.
Álvares Correia, que já conhecia um pouco a língua dos índios, espera amansá-los com horror e arte. Levantando a viseira, convida Gupeva a tocar a armadura e o capacete. Observa, amigavelmente, que tudo aquilo o protege, afastando o inimigo, desde que não se coma carne humana. Ainda aterrorizado, o chefe indígena segue-o para dentro da gruta, onde Diogo acende a candeia, levando-o a crer que o náufrago tem poder nas mãos.
Sob a luz, vê, sem interesse, tudo que o branco retirara da nau. Aqui, o poeta, louva a ausência de cobiça dessa gente. Entre os objetos guardados pelos náufragos, Gupeva encanta-se com a beleza da virgem em uma gravura.Tão bela assim não seria a esposa de Tupã? Ou a mãe de Tupã? Nesse momento, encantado pela intuição do bárbaro, Diogo o catequiza, ganhando-lhe, assim a dedicação.
Saindo da gruta, o índio, agora manso e diferente, fala a seu povo Tupinambá, ao redor da gruta. Conta-lhes sobre o feito do emboaba, Diogo, e que Tupã o mandara para protegê-los. Para banquetear o amigo, saem para caçar. Durante o trajeto, Álvares Correia usa a espingarda, aterrorizando a todos que exclamam e gritam: Tupã Caramuru! Desde esse dia, o herói passa a ser o respeitado Caramuru - Filho do Trovão. Querendo terror e não culto, Diogo afirma-lhes que, como eles, é filho de Tupã e a este, também, se humilha. Mas que como filho do trovão, (dispara outro tiro) queimará aquele que negar obediência ao grande Gupeva.
Nas estrofes seguintes, o poeta descreve os costumes da selva. Caramuru instala-se na aldeia, onde imensas cabanas abrigam muitas famílias, que vivem em harmonia. Muitos índios querem vê-lo, tocá-lo. Outros, em sinal de hospitalidade, despem-no e colocam-no sobre a rede, deixando-o tranqüilo. Paraguaçu é uma índia, de pele branca e traços finos e suaves. Apesar de não amar Gupeva, está na tribo por ter-lhe sido prometida. Como sabe a língua portuguesa, Diogo quer vê-la. Após o encontro os dois estão apaixonados.
Canto III
À noite, Gupeva e Diogo conversam sob a tradução feita por Paraguaçu. O lusitano fica pasmo ao saber que, para o chefe da tribo, existe um princípio eterno; há alguém, Tupã, ser possante que rege o mundo; aquele que vence o nada, criando o universo. O espírito de Deus, de alguma maneira, comunica-se com essa gente. Gupeva eloqüente fala acerca da concepção dos selvagens sobre o tempo, o Céu, o Inferno. Abordam a lenda da pregação de S. Tomé em terras americanas. Concluindo a conversa, o cacique diz que estão para ser atacados pelos inimigos; Caramuru aconselha-o a ter calma. De repente, chegam os ferozes índios Caetés que, ao primeiro estrondo do mosquete, batem em retirada, correndo, caindo; achando, enfim, que o céu todo lhes cai em cima.
Canto IV
O temido invasor noturno é o Caeté, Jararaca, que ama Paraguaçu perdidamente. Ao saber que ela esta destinada a Gupeva, declara guerra. Após o ataque estrondoso do Filho do Trovão, Jararaca convoca outras nações indígenas com as quais tinha aliança: Ovecates, Petiguares, Carijós, Agirapirangas, Itatis. Conta-lhes que Gupeva prostrou-se aos pés de um emboaba pelo pouco fogo que acendera, oferecendo-lhe até a própria noiva. O cacique alerta-os que se todos agirem assim, correm o risco de serem desterrados e escravizados em sua própria terra, enchendo de emboabas a Bahia. Apela para a coragem dos nativos, dizendo que apesar do raio do Caramuru ser verdadeiro, ele nada teme, porque não vem de Deus. Não há forças fabricadas que a eles destruam. A guerra tem início e Paraguaçu também luta heroicamente e, num momento de perigo, é salva pelo amado lusitano.
Canto V
Depois da batalha, os amantes discorrem sobre o mal que habita o ser humano e qual a razão de Deus para permiti-lo. Em seguida, em Itaparica, o herói faz com que todos os índios se submetam a ele, destruindo as canoas com as quais Jararaca pretendia liquidá-lo.
Canto VI
As filhas dos chefes indígenas são oferecidas ao destemido Diogo, para que este os honre com o seu parentesco. Como ama Paraguaçu, aceita o parentesco, mas declina as filhas. Na mata, o herói encontra uma gruta com tamanho e forma de igreja e percebe ali a possibilidade dos nativos aceitarem a Fé Cristã, e se dispõe a doutriná-los. Mais tarde, salva a tripulação de um navio espanhol naufragado e, saudoso da Europa, parte com Paraguaçu em um barco francês.
Quando a nau ganha o mar, várias índias, interessadas em Álvares Correia, lançam-se nas águas para acompanhá-lo. Moema, a mais bela de todas, consegue chegar perto do navio Agarrada ao leme, brada todo seu amor não correspondido ao esquivo e cruel Caramuru. Implora para que ele dispare sobre ela seu raio. Ao dizer isso, desmaia e é sorvida pela água. As outras, que a acompanhavam, retornam tristes à praia. Nas demais estrofes do canto, a história do descobrimento do Brasil é contada ao comandante do barco francês.
Canto VII
Na França, o casal é recebido na corte e Paraguaçu é batizada com o nome da rainha Catarina de Médicis, mulher de Henrique II, que lhe serve de madrinha. Diogo lhes descreve tudo o que sabe a respeito da flora e fauna brasileira.
Canto VIII
Henrique II se predispõe a ajudar Diogo Álvares na tarefa de doutrinamento e assimilação dos índios, oferecendo-lhe tropa e recompensa. Fiel à monarquia portuguesa, o valente lusitano recusa tal proposta. Na viagem de volta ao Brasil, Catarina-Paraguaçu profetiza, prospectivamente, o futuro da nação. Descreve as terras da Bahia, suas povoações, igrejas, engenhos, fortalezas. Fala sobre seus governadores, a luta contra os franceses de Villegaignon, aliados aos Tamoios. Discorre sobre o ataque de Mem de Sá aos franceses no forte da enseada de Niterói e sobre a vitória de Estácio de Sá contra as mesmas forças.
Canto XIX
Prosseguindo em seu vaticínio, Catarina-Paraguaçu descreve a luta contra os holandeses que termina com a restauração de Pernambuco.
Canto X
A visão profética de Catarina-Paraguaçu acaba se transformando na da Virgem sobre a criação do universo. Ao chegar, o casal é recebido pela caravela de Carlos V que agradece a Diogo o socorro aos náufragos espanhóis. A história de Pereira Coutinho é narrada, enfatizando-se o apoio dos Tupinambás na dominação dos campos da Bahia e no povoamento do Recôncavo baiano.
Na cerimônia realizada na Casa da Torre, o casal revestido na realeza da nação espanhola, transfere-a para D. João III, representado na pessoa do primeiro Governador Geral, Tomé de Souza. A penúltima estrofe canta a preservação da liberdade do índio e a responsabilidade do reino para com a divulgação da religião cristã entre eles. Na última (epílogo), Diogo e Catarina, por decreto real, recebem as honras da colônia lusitana.
Caramurú, de Frei José de Santa Rita Durão
Moema - Vitor Meirelles-1875
"... Uma indígena, entretanto, prefere morrer a perder de vista o homem branco.
É Moema, que vai perecer tragada pelas ondas:Perde o lume dos olhos, pasma e treme,
Pálida a cor, o aspecto moribundo,
Com a mão já sem vigor, soltando o leme,
Entre as salsas* escumas desce ao fundo:Mas na onda do mar, que irado freme,
Tornando a aparecer desde o profundo:"Ah! Diogo cruel!" disse com mágoa
E sem mais vista ser, sorveu-se n'água."
CANTO X
I
Cheia de assombro a turba a dama admira
Tornada a si da suspensão pasmosa;
E da nova visão, que ali sentira,
Prossegue a ouvir-lhe a narração gostosa.
« Mais bela que esse sol que o mundo gira,
E com dor (disse) de purpúrea rosa,
Vi formar-se no céu nuvem serena,
Qual nasee a aurora em madrugada amena.
II
Vi luzeiros de chama rutilante
Sobre a esfera tecer claro diadema
Da matéria mais pura que o diamante,
Que obra parece de invenção suprema;
Luzia cada estrela tão brilhante,
Que parecia um sol, precioso emblema
De admirável, belíssima pessoa,
Que à roda da cabeça cinge a coroa.
III
De ouro fino os eabelos pareciam,
Que uma aura branda aos ares espalhava,
E uns dos outros talvez se dividiam,
E outra vez um com outro se enredava;
Frechas voando, mais não feririam,
Do que um só deles nalma penetrava;
Cabelos tão gentis, que o espôso amado
Se queixa que de um deles foi chagado. IV
A fronte bela, cândida, espaçosa,
Cheia de celestial serenidade,
Vislumbres dava pela luz formosa
Da imortal soberana claridade.
Vê-se ali mansidão reinar piedosa,
E envolta na modéstia a suavidade,
Com graça, a quem a olhava tão serena,
Que, excitando prazer, desterra a pena.
V
Dos dois olhos não há na terra idéia,
Que astros, flores, diamantes escurecem,
Ou na beleza de mil graças cheia,
Ou nos agrados, que brilhando of'recem,
Num olhar seu toda dama se encadeia,
E mil votos à roda lhe aparecem
Dos que a seu culto glorioso alista,
Outorgando o remédio numa vista.
VI
Das faces belas,
se na terra houvera
Imagem competente que pintara,
As flores mais gentis da primavera
Pelo encarnado e branco eu comparara;
Mas flor não nasce na terrena esfera,
Não há estrela no céu tão bela e clara,
Que não seja, se a opor-se-lhe se arrisca,
Menos que à luz do sol breve faísca.
VII
Da boca formosíssima pendente
Pasma em silêneio todo o céu profundo;
Boca que um Fiat pronunciou potente
Com mais efeito que se criasse um mundo.
Odorífero cheiro em todo o ambiente
Do lábio se espalhava rubicundo;
Fragrância celestial, que amante e pia
No filho com mil ósculos bebia.
VIII
Todos suspende em pasmo respeitoso
O amável formosíssimo semblante,
E mais nele se ostenta poderoso
O soberano autor do céu brilhante:
Pois quanto tem o Empiro de formoso,
Quanto a angélica luz de rutilante,
Quanto dos serafins o ardente incêndio,
De tudo aquele rosto era um compêndio.
IX
Nas brancas mãos, que angélicas se estendem,
Um desmaiado azul nas veias tinto,
Faz parecer aos olhos, quando atendem,
Alabastros com fundos de jacinto;
Ambas com doce abraço ao seio prendem
Formosura maior, que aqui não pinto;
Porque para pincel me não bastara
Quando Deus já eriou, quanto criara.
X
Mas, se não se dedigna o verbo santo,
Por nosso amor, de um simbolo rasteiro,
Dentro parece do virgíneo manto,
Pascendo em brancos lídios um cordeiro.
Os olhos com suavíssimo quebranto
Lhe ocupa um doce sono lisonjeiro,
À roda os serafins, que o estrondo impedem,
Para o não despertar silêneio pedem.
XI
Aos pés da mãe piedosa superada
Vê-se a antiga serpente insidiosa,
De que a fronte na culpa levantada
Quebra a planta virgínea gloriosa;
E, enroscando os mortais já quebrantada,
Ao céu só da Virgem poderosa,
No mais fundo do abismo se submerge,
E o feral antro do veneno asperge.
XII
Ao ver beleza tanta, o pensamento,
Que a linda imagem surprendia absorto,
Ouve no centro dalma um doce acento
Que o peito enchia de vital conforto.
E, como infunde às plantas novo alento
O matutino orvalho em fértil horto,
Tal dos doces influxos na abundância
Dentro dalma eu senti nova constância.
XIII
« Catarina (me diz), verás ditosa
Outra vez do Brasil a terra amada;
Faze que a imagem minha gloriosa
Se restitua de vil mão roubada! »
E assim dizendo, nuvem luminosa,
Como véu, cobre a face desejada,
E faz que na memória firme exista
Entre amor e saudade a doce vista.
XIV
Assim conclui Catarina, enchendo
De duvidoso assombro a companhia.
Que imagem fosse aquela, iam dizendo,
Ou qual deles acaso a roubaria?
Se a Mãe de Deus, mistérios envolvendo,
Doutra cópia int'rior o entenderia,
Ou queria talvez que em santo trato
Se restitua nalma o seu retrato?
XV
Mas vela em tanto apareceu boiante
Que junto da Bahia o mar cortava,
Onde em bandeira, que lançou flamante,
O leão das Espanhas tremulava.
Vem à fala com salva fulminante,
E a franca nau, que à terra velejava.
Posto à capa o espanhol, cortês visita,
E o claro Diogo a visitá-lo incita.
XVI
E, depois que em festivo amigo abordo
O bom Gonzales o hóspede festeja,
Excitou-se nos dois claro recordo
De quem o hispano foi, quem Diogo seja;
Ambos nos braços, de comum acordo,
Um a outro mil ditas se deseja,
Reconhecendo o luso o nobre hispano,
Por um dos companheiros de Arelhano.
XVII
« Carlos o grande, o imperador famoso,
Grato por mim a saudar-te envia
(Disse a Diogo o hispano generoso,
Socorrido a outro tempo na Bahia).
Ouviu o invicto César, gracioso,
O teu obséquio à espanha monarquia,
E o serviço, que grande considera,
Por mim do seu agrado remunera.
XVII
E por que possa em caso equivalente
Retribuir-te aquela ação piedosa,
Salva aqui te ofereço a infausta gente,
Perdida nessa praia desditosa,
De cativeiro bárbaro e inclemente
Vivia na opressão laboriosa,
Até que destas armas protegida
Remiu na liberdade a infausta vita. »
XIX
Garcez então, da gente lusitana
O mais distinto que o discurso ouvia,
Confessa o benefício a força hispana,
E a história de seus casos principia: «
Depois que a gente abandonaste insana,
Com seu aviso, a lusa monarquia
Gente aqui mandou, naus poderosas,
Que as nações sujeitassem belicosas.
XX
Foi Pereira Coutinho o destinado
A fazer da Bahia a grã-conquista,
Herói no índico império celebrado,
Em quem nova esperança o luso avista,
Tudo tinha o bom chefe preparado,
Formosas naus ajunta e gente alista
E à grã-população que meditava
De um sexo e doutro as gentes convidava.
XXI
E, sem demora as praias ocupando,
Foi dos Tupinambás, com teu recordo,
As potentes aldeias visitando,
Com amiga aliança em firme acordo.
Do sertão vasto em numeroso bando
Desciam, festejando o nosso abordo,
Os carijós, tapuias e outras gentes,
Por fama do teu nome obedientes.
XXII
Gupeva e Taparica celebrados
Entre os tupinambás, nação que habita
Os campos da Bahia dilatados,
Antes de outros Coutinho solicita;
E, por vê-los contigo emparentados,
Povoar o Recôncavo medita
Da gente, que o teu nome reconhece,
Onde de dia a dia o povo cresce.
XXIII
Todo o fértil terreno utilizando,
Donde riqueza se oferece tanta,
Engenhos vai de açúcar fabricando,
Aldeias, casas, máquinas levanta.
E as drogas preciosas comutando,
A mandioca, arroz e a cana planta;
Nem dúvida que seja em tempo breve
A colônia melhor que Europa teve.
XXIV
Escolha faz nas tabas numerosas
Dos que acha no trabalho mais ativos;
Mas guarda para empresas belicosas
Os que em ferócia reconhece altivos.
A todos com maneiras amorosas
Propõe da fé cristã elaros motivos;
E, a condição notando em cada raça.
Uns doma eom terror, outros com graça.
XXV
Sabe que em gente tal nada se colhe,
Depois de endurecer na idade adulta,
Onde na puerícia os mais escolhe,
Por dar-lhe em breve a educação mais culta.
Nem dos pais violento algum recolhe;
Mas do proveito, que de alguns resulta,
Induz a gente bárbara que o segue
Que a prole à educação gostosa entregue.
XXVI
Em cuidadosa escola,
o temor santo Antes das artes a qualquer se ensina;
Dão-lhes lições de ler, contar, de canto,
E o catecismo da cristã doutrina;
Vendo-os o rude pai, concebe espanto,
E pelo filho a mãe à fé se inclina;
Nem de meio entre nós mais apto se usa
Que aquela gente bárbara reduza.
XXVII
E estes serão, se a idéia não me engana,
Meios à grande empresa necessários,
Que em breve a gente rude fora humana,
Com escolas e régios seminários.
Foge, sem se domar, a gente insana,
Se em forças e poder nos vê contrários;
Mas, educada em tenra mocidade,
Dilataria o reino e a cristandade.
XXVIII
Mas no meio das belas esperanças,
Com que a nova colônia florescia,
Move a serpe infernal desconfianças
Entre os tupinambás e os da Bahia:
Foi a causa infeliz destas mudanças
Um interesse vil de gente impia,
Que os povos ofendendo em paz amigos,
Cobrirarn toda a terra de inimigos.
XXIX
Gupeva foi dos seus abandonado;
Taparica foi mono; a lusa gente
Do gentio nos matos rebelado
Contínua perda nas lavouras sente.
Queimada a planta foi, perdido o gado,
E, cereado o arraial em contingente,
Viu Coutinho por bárbara violência
Perdido o seu tesouro e diligência
XXX
Na geral aflição do luso povo
A lugar se recorre mais tranqüilo;
Buscamos nos Ilhéus um sítio novo
Contra a turba feroz, seguro asilo.
E já Coutinho se dispõe de novo,
Vendo manso o gentio, a reduzi-lo,
Fabricando colônia de mais dura,
Menos fecunda, sim, mas mais segura.
XXXI
Mas os Tupinambás,
melhor cuidando,
Com promessas os nossos convidavam,
Com mil amigas provas protestando
De conservar a paz que antes guardavam,
Creu o infeliz Coutinho,
celebrando Pactos que segurança a todos davam;
E, sem temor de mais,
voltar queria
Ao Recôncavo antigo da Bahia.
XXXII
E já no mar a frota se equipava,
E cada um de nós na empresa absorto,
Sem temor, ou receio,
só cuidava Em fazer ao Recôncavo transporto,
Navegamos o espaço que distava,
E, tendo à vista o desejado porto,
Com fúria o mar aos astros se levanta,
Em cerração do céu que à vista espanta.
XXXIII
O ar caliginoso e em névoa impuro
Tirou-nos toda a vista, e sem destino
Batemos cegos num penhasco duro,
Sem termos do lugar notícia ou tino.
Neste momento horrível, transe escuro,
Suplicando o favor do céu divino,
Vemos a nau, com hórridos fracassos,
Desfazer-se na penha em mil pedaços.
XXXIV
Ficamos, como o entendes, alagados,
Nadando em meio da procela horrenda;
Uns das ondas se afogam devorados,
Outros na praia em confusão tremenda.
E eis que os cruéis tupis encarniçados
Com frechas se empenharam na contenda,
Por levar-nos da areia semi-vivos
À sorte dos seus míseros cativos.
XXXV
Muitos vimos dos bárbaros comidos,
Alguns dispostos ao funesto ocaso,
Aflitos todos nós e esmorecidos,
E esperando qualquer seu triste prazo;
Mas de ti sobretudo condoídos,
Triste Coutinho, que no acerbo caso,
Depois de triunfar da Ásia assombrada,
Perdeste infelizmente a vida amada.
Moema - Vitor Meirelles-1875
"... Uma indígena, entretanto, prefere morrer a perder de vista o homem branco.
É Moema, que vai perecer tragada pelas ondas:Perde o lume dos olhos, pasma e treme,
Pálida a cor, o aspecto moribundo,
Com a mão já sem vigor, soltando o leme,
Entre as salsas* escumas desce ao fundo:Mas na onda do mar, que irado freme,
Tornando a aparecer desde o profundo:"Ah! Diogo cruel!" disse com mágoa
E sem mais vista ser, sorveu-se n'água."
CANTO X
I
Cheia de assombro a turba a dama admira
Tornada a si da suspensão pasmosa;
E da nova visão, que ali sentira,
Prossegue a ouvir-lhe a narração gostosa.
« Mais bela que esse sol que o mundo gira,
E com dor (disse) de purpúrea rosa,
Vi formar-se no céu nuvem serena,
Qual nasee a aurora em madrugada amena.
II
Vi luzeiros de chama rutilante
Sobre a esfera tecer claro diadema
Da matéria mais pura que o diamante,
Que obra parece de invenção suprema;
Luzia cada estrela tão brilhante,
Que parecia um sol, precioso emblema
De admirável, belíssima pessoa,
Que à roda da cabeça cinge a coroa.
III
De ouro fino os eabelos pareciam,
Que uma aura branda aos ares espalhava,
E uns dos outros talvez se dividiam,
E outra vez um com outro se enredava;
Frechas voando, mais não feririam,
Do que um só deles nalma penetrava;
Cabelos tão gentis, que o espôso amado
Se queixa que de um deles foi chagado. IV
A fronte bela, cândida, espaçosa,
Cheia de celestial serenidade,
Vislumbres dava pela luz formosa
Da imortal soberana claridade.
Vê-se ali mansidão reinar piedosa,
E envolta na modéstia a suavidade,
Com graça, a quem a olhava tão serena,
Que, excitando prazer, desterra a pena.
V
Dos dois olhos não há na terra idéia,
Que astros, flores, diamantes escurecem,
Ou na beleza de mil graças cheia,
Ou nos agrados, que brilhando of'recem,
Num olhar seu toda dama se encadeia,
E mil votos à roda lhe aparecem
Dos que a seu culto glorioso alista,
Outorgando o remédio numa vista.
VI
Das faces belas,
se na terra houvera
Imagem competente que pintara,
As flores mais gentis da primavera
Pelo encarnado e branco eu comparara;
Mas flor não nasce na terrena esfera,
Não há estrela no céu tão bela e clara,
Que não seja, se a opor-se-lhe se arrisca,
Menos que à luz do sol breve faísca.
VII
Da boca formosíssima pendente
Pasma em silêneio todo o céu profundo;
Boca que um Fiat pronunciou potente
Com mais efeito que se criasse um mundo.
Odorífero cheiro em todo o ambiente
Do lábio se espalhava rubicundo;
Fragrância celestial, que amante e pia
No filho com mil ósculos bebia.
VIII
Todos suspende em pasmo respeitoso
O amável formosíssimo semblante,
E mais nele se ostenta poderoso
O soberano autor do céu brilhante:
Pois quanto tem o Empiro de formoso,
Quanto a angélica luz de rutilante,
Quanto dos serafins o ardente incêndio,
De tudo aquele rosto era um compêndio.
IX
Nas brancas mãos, que angélicas se estendem,
Um desmaiado azul nas veias tinto,
Faz parecer aos olhos, quando atendem,
Alabastros com fundos de jacinto;
Ambas com doce abraço ao seio prendem
Formosura maior, que aqui não pinto;
Porque para pincel me não bastara
Quando Deus já eriou, quanto criara.
X
Mas, se não se dedigna o verbo santo,
Por nosso amor, de um simbolo rasteiro,
Dentro parece do virgíneo manto,
Pascendo em brancos lídios um cordeiro.
Os olhos com suavíssimo quebranto
Lhe ocupa um doce sono lisonjeiro,
À roda os serafins, que o estrondo impedem,
Para o não despertar silêneio pedem.
XI
Aos pés da mãe piedosa superada
Vê-se a antiga serpente insidiosa,
De que a fronte na culpa levantada
Quebra a planta virgínea gloriosa;
E, enroscando os mortais já quebrantada,
Ao céu só da Virgem poderosa,
No mais fundo do abismo se submerge,
E o feral antro do veneno asperge.
XII
Ao ver beleza tanta, o pensamento,
Que a linda imagem surprendia absorto,
Ouve no centro dalma um doce acento
Que o peito enchia de vital conforto.
E, como infunde às plantas novo alento
O matutino orvalho em fértil horto,
Tal dos doces influxos na abundância
Dentro dalma eu senti nova constância.
XIII
« Catarina (me diz), verás ditosa
Outra vez do Brasil a terra amada;
Faze que a imagem minha gloriosa
Se restitua de vil mão roubada! »
E assim dizendo, nuvem luminosa,
Como véu, cobre a face desejada,
E faz que na memória firme exista
Entre amor e saudade a doce vista.
XIV
Assim conclui Catarina, enchendo
De duvidoso assombro a companhia.
Que imagem fosse aquela, iam dizendo,
Ou qual deles acaso a roubaria?
Se a Mãe de Deus, mistérios envolvendo,
Doutra cópia int'rior o entenderia,
Ou queria talvez que em santo trato
Se restitua nalma o seu retrato?
XV
Mas vela em tanto apareceu boiante
Que junto da Bahia o mar cortava,
Onde em bandeira, que lançou flamante,
O leão das Espanhas tremulava.
Vem à fala com salva fulminante,
E a franca nau, que à terra velejava.
Posto à capa o espanhol, cortês visita,
E o claro Diogo a visitá-lo incita.
XVI
E, depois que em festivo amigo abordo
O bom Gonzales o hóspede festeja,
Excitou-se nos dois claro recordo
De quem o hispano foi, quem Diogo seja;
Ambos nos braços, de comum acordo,
Um a outro mil ditas se deseja,
Reconhecendo o luso o nobre hispano,
Por um dos companheiros de Arelhano.
XVII
« Carlos o grande, o imperador famoso,
Grato por mim a saudar-te envia
(Disse a Diogo o hispano generoso,
Socorrido a outro tempo na Bahia).
Ouviu o invicto César, gracioso,
O teu obséquio à espanha monarquia,
E o serviço, que grande considera,
Por mim do seu agrado remunera.
XVII
E por que possa em caso equivalente
Retribuir-te aquela ação piedosa,
Salva aqui te ofereço a infausta gente,
Perdida nessa praia desditosa,
De cativeiro bárbaro e inclemente
Vivia na opressão laboriosa,
Até que destas armas protegida
Remiu na liberdade a infausta vita. »
XIX
Garcez então, da gente lusitana
O mais distinto que o discurso ouvia,
Confessa o benefício a força hispana,
E a história de seus casos principia: «
Depois que a gente abandonaste insana,
Com seu aviso, a lusa monarquia
Gente aqui mandou, naus poderosas,
Que as nações sujeitassem belicosas.
XX
Foi Pereira Coutinho o destinado
A fazer da Bahia a grã-conquista,
Herói no índico império celebrado,
Em quem nova esperança o luso avista,
Tudo tinha o bom chefe preparado,
Formosas naus ajunta e gente alista
E à grã-população que meditava
De um sexo e doutro as gentes convidava.
XXI
E, sem demora as praias ocupando,
Foi dos Tupinambás, com teu recordo,
As potentes aldeias visitando,
Com amiga aliança em firme acordo.
Do sertão vasto em numeroso bando
Desciam, festejando o nosso abordo,
Os carijós, tapuias e outras gentes,
Por fama do teu nome obedientes.
XXII
Gupeva e Taparica celebrados
Entre os tupinambás, nação que habita
Os campos da Bahia dilatados,
Antes de outros Coutinho solicita;
E, por vê-los contigo emparentados,
Povoar o Recôncavo medita
Da gente, que o teu nome reconhece,
Onde de dia a dia o povo cresce.
XXIII
Todo o fértil terreno utilizando,
Donde riqueza se oferece tanta,
Engenhos vai de açúcar fabricando,
Aldeias, casas, máquinas levanta.
E as drogas preciosas comutando,
A mandioca, arroz e a cana planta;
Nem dúvida que seja em tempo breve
A colônia melhor que Europa teve.
XXIV
Escolha faz nas tabas numerosas
Dos que acha no trabalho mais ativos;
Mas guarda para empresas belicosas
Os que em ferócia reconhece altivos.
A todos com maneiras amorosas
Propõe da fé cristã elaros motivos;
E, a condição notando em cada raça.
Uns doma eom terror, outros com graça.
XXV
Sabe que em gente tal nada se colhe,
Depois de endurecer na idade adulta,
Onde na puerícia os mais escolhe,
Por dar-lhe em breve a educação mais culta.
Nem dos pais violento algum recolhe;
Mas do proveito, que de alguns resulta,
Induz a gente bárbara que o segue
Que a prole à educação gostosa entregue.
XXVI
Em cuidadosa escola,
o temor santo Antes das artes a qualquer se ensina;
Dão-lhes lições de ler, contar, de canto,
E o catecismo da cristã doutrina;
Vendo-os o rude pai, concebe espanto,
E pelo filho a mãe à fé se inclina;
Nem de meio entre nós mais apto se usa
Que aquela gente bárbara reduza.
XXVII
E estes serão, se a idéia não me engana,
Meios à grande empresa necessários,
Que em breve a gente rude fora humana,
Com escolas e régios seminários.
Foge, sem se domar, a gente insana,
Se em forças e poder nos vê contrários;
Mas, educada em tenra mocidade,
Dilataria o reino e a cristandade.
XXVIII
Mas no meio das belas esperanças,
Com que a nova colônia florescia,
Move a serpe infernal desconfianças
Entre os tupinambás e os da Bahia:
Foi a causa infeliz destas mudanças
Um interesse vil de gente impia,
Que os povos ofendendo em paz amigos,
Cobrirarn toda a terra de inimigos.
XXIX
Gupeva foi dos seus abandonado;
Taparica foi mono; a lusa gente
Do gentio nos matos rebelado
Contínua perda nas lavouras sente.
Queimada a planta foi, perdido o gado,
E, cereado o arraial em contingente,
Viu Coutinho por bárbara violência
Perdido o seu tesouro e diligência
XXX
Na geral aflição do luso povo
A lugar se recorre mais tranqüilo;
Buscamos nos Ilhéus um sítio novo
Contra a turba feroz, seguro asilo.
E já Coutinho se dispõe de novo,
Vendo manso o gentio, a reduzi-lo,
Fabricando colônia de mais dura,
Menos fecunda, sim, mas mais segura.
XXXI
Mas os Tupinambás,
melhor cuidando,
Com promessas os nossos convidavam,
Com mil amigas provas protestando
De conservar a paz que antes guardavam,
Creu o infeliz Coutinho,
celebrando Pactos que segurança a todos davam;
E, sem temor de mais,
voltar queria
Ao Recôncavo antigo da Bahia.
XXXII
E já no mar a frota se equipava,
E cada um de nós na empresa absorto,
Sem temor, ou receio,
só cuidava Em fazer ao Recôncavo transporto,
Navegamos o espaço que distava,
E, tendo à vista o desejado porto,
Com fúria o mar aos astros se levanta,
Em cerração do céu que à vista espanta.
XXXIII
O ar caliginoso e em névoa impuro
Tirou-nos toda a vista, e sem destino
Batemos cegos num penhasco duro,
Sem termos do lugar notícia ou tino.
Neste momento horrível, transe escuro,
Suplicando o favor do céu divino,
Vemos a nau, com hórridos fracassos,
Desfazer-se na penha em mil pedaços.
XXXIV
Ficamos, como o entendes, alagados,
Nadando em meio da procela horrenda;
Uns das ondas se afogam devorados,
Outros na praia em confusão tremenda.
E eis que os cruéis tupis encarniçados
Com frechas se empenharam na contenda,
Por levar-nos da areia semi-vivos
À sorte dos seus míseros cativos.
XXXV
Muitos vimos dos bárbaros comidos,
Alguns dispostos ao funesto ocaso,
Aflitos todos nós e esmorecidos,
E esperando qualquer seu triste prazo;
Mas de ti sobretudo condoídos,
Triste Coutinho, que no acerbo caso,
Depois de triunfar da Ásia assombrada,
Perdeste infelizmente a vida amada.
video sobre arcadismo
http://www.youtube.com/watch?v=UYLMuItR0zc
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José de Santa Rita Durão
Sua vida
Frei José de Santa Rita Durão nasceu em Cata-Pretanas (nas proximidades de Mariana), Minas Gerais. Seus estudos tiveram início com os jesuítas no Rio de Janeiro. Formou-se em Teologia pela Universidade de Coimbra e ingressou na Ordem de Santo Agostinho. Nesse período, por volta de 1759, fez uma pregação contra os padres da Companhia de Jesus pela expulsão dos jesuítas, mas depois se arrependeu durante a repressão do período pombalino, fugiu para a Itália, onde levou uma vida de estudos, durante mais de 20 anos.
Características do autor
A manifestação poética de Santa Rita Durão expressa o nativismo, estampado na exaltação da paisagem brasileira, dos seus recursos naturais, dos índios: seus costumes e suas tradições. Durão faz referências a fatos históricos, do século 16 até sua época. Apesar do retrocesso ao tipo de crônica informativa dos anos 1600, seu texto pertence à corrente literária do Arcadismo e valoriza a vida natural e simples, distante da corrupção.
Uma breve pincelada da corrente literária do Arcadismo no Brasil
O Arcadismo no Brasil teve início no ano de 1768, com a publicação do livro “Obras” de Cláudio Manuel da Costa.
Nesse período Portugal explorava suas colônias a fim de conseguir suprir seu déficit econômico. A economia brasileira estava voltada para a era do ouro, da mineração e, portanto, ao estado de Minas Gerais, campo de extração contínua de minérios. No entanto, os minérios começaram a ficar escassos e os impostos cobrados por Portugal aos colonos ficaram exorbitantes.
Surgiu, então, a necessidade do Brasil de buscar uma forma de se desvincular do seu explorador. Logo, os ideais revolucionários começaram a se desenvolver no Brasil, sob influências das Revoluções Industrial e Francesa, ocorridas na Europa, bem como do exemplo da independência das 13 colônias inglesas.
Enquanto na Europa surgia o trabalho assalariado, o Brasil ainda vivia o tempo de escravidão. Há um processo de revoltas no Brasil, contudo, a mais eloquente durante o período árcade é a Inconfidência Mineira, movimento que teve envolvimentos dos escritores árcades, como Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Cláudio Manuel da Costa, além do dentista prático Tiradentes.
O Arcadismo no Brasil é diferente do europeu. Em primeiro lugar, usa a paisagem mineira como cenário bucólico, valoriza as coisas da terra, revelando um forte sentimento nativista. A presença do índio na poesia reflete o ideal do "bom selvagem iluminista", que não existe nos poemas europeus. Outra característica é a sátira política à opressão portuguesa e da corrupção colonial.
Os principais autores árcades são: Cláudio Manoel da Costa, Tomás Antonio Gonzaga, Basílio da Gama, Silva Alvarenga e Frei José de Santa Rita Durão.
Sua obra

"Viajou pela Espanha, Itália e França,voltou a Portugal na época da queda do Marquês de Pombal e a restauração da monarquia tradicional e foi quando se dedicou a escrever o seu grande poema épico "Caramuru", publicado em 1781. O qual tem como subtítulo “Poema épico do Descobrimento da Bahia”, escrito no padrão da poesia de Camões.
Conta-se que a obra teria sido recebida com indiferença e que isso fez Santa Rita Durão destruir várias poesias líricas suas.
Característica da obra
O poema épico Caramuru é publicado doze anos depois de O Uraguai, contudo não existe uma continuidade entre ambos. Nem formal, nem ideológica. Ao contrário de Basílio da Gama, admirador de Pombal, Santa Rita Durão lembra o período pombalino como uma época de horrores. Assim, a visão anti-jesuítica de seu antecessor cede lugar a uma narrativa de inspiração religiosa.
Também ao inverso de Basílio da Gama, que procurou inovar usando versos brancos e dividindo o poema em apenas cinco cantos, o bom Frei segue rigidamente o modelo camoniano de Os Lusíadas. Realiza seu poema em dez cantos, com estrofes de oito versos decassílabos e rimados.
"O Caramuru" faz um balanço da colonização em meio a uma descrição hiperbólica da natureza. Neste poema são exaltadas a fé e a defesa da terra contra os invasores. Segundo o crítico Antonio Candido, "A obra de Durão pode ser vista tanto como expressão do triunfo português na América quanto das posições particularistas dos americanos; e serviria, em princípio, seja para simbolizar a lusitanização do país, seja para acentuar o nativismo.
Prosopopeia
Assim como sua biografia, são confusas as informações relativas as obras escritas por Bento Teixeira. Muitas foram lhe atribuídas. As principais são:
-Relações do naufrágio: De acordo com os estudos de Vernhagen, a obra é de autoria de Afonso Luís, piloto de uma nau chamada "Santo Antônio", citado em Prosopopéia.
-Diálogos das grandezas do Brasil: Segundo Capistrano de Abreu, a obra é de autoria de Ambrósio Fernandes Brandão.
Portanto, ao que tudo indica, Prosopopéia foi sua única obra.
Prosopopéia
Publicada em 1601, de grande valor histórico, a obra mais famosa do escritor é o poema épico, já citado, Prosopopéia. Nele, o escritor fala sobre a vida e o trabalho de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da Capitania de Pernambuco, e seu irmão, Duarte. É a única obra reconhecida e aceita como de sua autoria. Além disso, é a primeira obra com finalidade meramente literária publicada em solo brasileiro.
Escrito em oitava rima, com noventa e quatro estrofes, o poema marcou o início do movimento barroco no Brasil. Ao que parece, a obra foi influenciada pelo poema Os Lusíadas, de Camões. Tal influência é percebida quando analisada a sintaxe, e a estrutura. A sintaxe é extremamente clássica, cheia de inversões, o que dificulta o entendimento por um leitor do século XXI. A estrutura segue de perto a da obra de Camões, como se percebe já de inicio pela existência de proposição (Onde apresenta o assunto da epopéia: cantar os feitos de Jorge d'Albuquerque), invocação (quando pede ajuda do Deus cristão para compor seu texto) e dedicação (o texto é dedicado a Jorge d'Albuquerque, visando ajuda financeira).
De caráter heróico, a suposta coragem e valentia dos irmãos é narrada em decassílabos. Os acontecimentos abordados dizem respeito as terras brasileiras e a região de Alcácer-Quibir, na África, onde os irmãos teriam se destacado em uma importante batalha. Ambos, teriam também sofrido com um naufrágio, quando viajavam na nau Santo Antônio.
Prosopopéia
Publicada em 1601, de grande valor histórico, a obra mais famosa do escritor é o poema épico, já citado, Prosopopéia. Nele, o escritor fala sobre a vida e o trabalho de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da Capitania de Pernambuco, e seu irmão, Duarte. É a única obra reconhecida e aceita como de sua autoria. Além disso, é a primeira obra com finalidade meramente literária publicada em solo brasileiro.
Escrito em oitava rima, com noventa e quatro estrofes, o poema marcou o início do movimento barroco no Brasil. Ao que parece, a obra foi influenciada pelo poema Os Lusíadas, de Camões. Tal influência é percebida quando analisada a sintaxe, e a estrutura. A sintaxe é extremamente clássica, cheia de inversões, o que dificulta o entendimento por um leitor do século XXI. A estrutura segue de perto a da obra de Camões, como se percebe já de inicio pela existência de proposição (Onde apresenta o assunto da epopéia: cantar os feitos de Jorge d'Albuquerque), invocação (quando pede ajuda do Deus cristão para compor seu texto) e dedicação (o texto é dedicado a Jorge d'Albuquerque, visando ajuda financeira).
De caráter heróico, a suposta coragem e valentia dos irmãos é narrada em decassílabos. Os acontecimentos abordados dizem respeito as terras brasileiras e a região de Alcácer-Quibir, na África, onde os irmãos teriam se destacado em uma importante batalha. Ambos, teriam também sofrido com um naufrágio, quando viajavam na nau Santo Antônio.
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